segunda-feira

A mulher e a estátua

Resolvi escrever para esse blog também. Faz um tempo – mas não muito – recebi um convite: Faça parte da nossa equipe! Achei esquisito, procurei saber se pagavam bem, se a equipe era legal, e se o espaço era regularmente utilizado por um bom debate. Tudo que encontrei foi um não paras as mesmas questões. Não há debate – todos não gostam do Jabor, por exemplo. Não se paga nada, e, ainda por cima, os “cronistas” são um grupo de pseudo-intelectuais-de-esquerda-cult-bacaninha-que-curte-falar-mal-da-veja. (Por isso que eu gosto da língua alemã. Não acho bonita, mas é funcional. Com certeza teriam uma só palavra para isso, apesar de desconfiar de que os alemães correrem maior risco de ter câncer de laringe.)

Enfim, resolvi colaborar. Tanto escrevendo como seqüestrando o Jabor.

Em Copacabana. Deveria ser aproximadamente o pico do horário do caos. Ou seja, de 10 às 19 horas. Para facilitar na visualização do leitor mais exigente, adianto que o astro-rei fervia a todo vapor. De dentro do ônibus, derretendo, não era possível conciliar com os 39 graus do termômetro de perto da Figueiredo de Magalhães. Ou seja, uma aprazível tarde de inverno no Rio. Tento me entreter com alguma coisa que não exigisse muito de minha mente escaldada, até que avisto uma estátua humana. Por quinze minutos pude servir como testemunha ocular que aquele homem não se mexia e tinha uma respiração quase que imperceptível. O figurino estava completo: prateado da cabeça aos pés, incluindo lábios, lóbulos das orelhas, umbigo e pálpebras; braço direito erguido, mão levantada com os dedos levemente separados; e, para completar, um pombo feiqui na cabeça. Percebi a aproximação de uma provável moradora de rua pela qual meus olhos já tinham passado quando estava sentada próximo à estátua pedindo dinheiro.

(Aqui, concordo que o fato de um mendigo se aproximar não seja nada relevante, ainda mais se levado em conta for o local em que a cena se desdobra. Em Copacabana, a população de rua só não é maior que a de velhinhos, mas com certeza é o bairro da cidade onde tem mais mendigos da terceira idade. Enfim, inútil comentário.)

Ao relevante. A senhorita aproximava-se mais da estátua queixando-se de alguma coisa. Até que pude ouvir:

- Não dá pra tu ficar aí não! – exclamou, gesticulando de forma a remeter a uma idéia de fim de papo no Maracanã. Deu um curto intervalo para esperar alguma reação da estátua, quando sem sucesso voltou a repetir:

- Não dá pra tu ficar aí não, tá me ouvino?! Ou tu também não escuta? Olha pra mim que eu tô falando contigo, porra!

Uma velhinha que vinha passando parou, olhou a situação, mas como a estátua não executava movimento e nem ensaiava reação, não julgou a situação como de potencial entretenimento.

- Olha aqui, esse ponto aqui é meu. Eu sempre peço dinheiro aqui. Se tu quiser, vai ficar do lado do velhinho lá da praia... mas aqui não tá dano pá tu, não! Tu fica aí paradão, todo pintado, recebendo dinheiro sem fazer nada! O quê que tu faz? Os verme tinha que tirar tu também... Porra, tá roubando a minha grana, tirano meu lugar, ninguém nem olha mais meus dois meninu... Esse povo já faz de tudo para desviar o olho da gente e você ainda fica aí, todo pintado, querendo aparecer... Se quiser pedir dinheiro, mermão, desce dessa porra, tira a merda dessa tinta, e faz que nem todo mundo, estende a mão, diz que tá com fome, que precisa comprar remédio, sei lá... dá teu jeito!

O ônibus andou.

Um comentário:

Camila disse...

já q agora temos comentários, vamos lá:
lembrei de uma cena parecida que aconteceu na época do meu trote. um mendingo ficou indignado pq nós, calouros pintados de palhaço, estávamos no ponto dele. sem noção.