quinta-feira

Os bastidores da notícia

A notícia:

Incêndio destrói loja na Tijuca

Um incêndio destruiu uma loja de utensílios para o lar na Praça Saens Peña, na Tijuca, zona norte, na noite de ontem. O fogo começou por volta das 21h, e bombeiros de cinco quartéis levaram cerca de três horas para controlá-lo. As causas do incidente ainda são desconhecidas, mas suspeita-se de um curto circuito. As chamas teriam começado no estoque da loja que fica no segundo andar do prédio.

Moradores de uma vila que fica atrás da loja tiveram que abandonar suas casas. Três mulheres, entre elas uma idosa de 94 anos, passaram mal, foram atendidas no local e liberadas. Um morador da Vila do Dragão disse que tentou impedir que o fogo avançasse sobre as casas utilizando uma mangueira.

- A janela onde molhei esteve bem perto de pegar fogo - afirmou.

O proprietário da loja, Enéas Freire, de 56 anos, chegou ao local cerca de meia hora após o início do incêndio. Acompanhado da mulher e dos filhos, ele disse que a loja não tinha seguro. A inspeção para risco de incêndio foi feita no estabelecimento há dois meses.

- Tenho essa loja há sete anos. Agora é reconstruir e voltar a trabalhar - disse, resignado.

A preocupação dos bombeiros, que contaram com a auxílio de sete caminhões-pipa, era evitar que o fogo se alastrasse para outras lojas e casas do entorno. Dona de uma casa colada à loja incendiada, Sônia Schaifer estava aflita:

- Ninguém mora lá, mas a casa está toda mobiliada. É uma sensação de impotência.



O bastidor:

Ontem estava conversando com a minha mãe na sala de casa quando ela avistou pela janela uma nuvem de fumaça vinda da Praça Saens Peña. Me deu vontade de ir lá, e eu fui. De bloco e caneta em punho, desci a Conde de Bonfim, seguindo o rastro da fumaça.

Logo no início da praça já podia ver o incêndio na Loja Bandeirantes, que fica no número 13, perto da entrada do metrô. Fui o primeiro repórter a chegar lá - e olha que nem sou formado. Após conferir algumas informações preliminares com a polícia e os bombeiros, liguei pra redação. O lugar estava isolado, o acesso restrito às equipes de salvamento, polícia e imprensa.

Pouco depois chegam os primeiros coleguinhas, depois outros e mais outros, inclusive do jornal. A falta de vítimas fez com que muitos começassem a desejar ir embora, muitos alegavam que a história não renderia mais do que um colunão.

Uma hora, refestelados na escada do metrô e no entorno, ouvimos um chamado da multidão:

"Moço, dá pra chegar um pouquinho mais pra lá, tá estragando a foto!"

Era uma mulher com uma touca do Flamengo e câmera digital em posição de disparar. Constrangido e surpreso, dei dois passos pro lado, ganhando a simpatia da proto-fotógrafa.

"Depois a gente que é chamado de urubu", reclamou um fotógrafo, este devidamente credenciado.

Aí que fui reparar na turba ao redor. Todos apontavam celulares, máquinas, I Pods e bugigangas mil para o incêndio. Um dos "curiosos" se apresentou a mim como estudante de jornalismo da Estácio: queria me vender as fotos que tirou no seu celular. Mal sabia que eu sou o elo mais fraco da cadeia.

Horas de fogo intenso depois, tiros do outro lado da praça. Equipes remanescentes correm para lá. Ensaio uma corridinha em direção à confusão. Briga de torcida. Rubro-negros reclamando que homens do Core teriam atirado na sua direção.

Não valia a pena, no máximo um colunão. Voltei pra casa.

quarta-feira

Intenção de domingo

Acordo. Com uma leve intenção de domingo. "Tudo deve estar suspenso". As janelas fechadas confirmam a segunda sentença. Intenção de domingo. Levanto. Arrumo a cara no lugar correto. Nem tomo café. Sei que terei silêncio pelas ruas. Elevador. Tudo ainda no ar. Mais um dia? O porteiro é gentil como de costume e fala do dia de forma rápida: – Bom dia. Tudo leve. No corte que me sobra da rua que vejo – não há carros – silêncio. A porta se abre. Ainda é silencio. Um labrador. Na verdade, não sei se era mesmo. O que vi foi um cão. Intenção de domingo. Dou mais um passo. Ledo engano. O verde do sinal insiste em trazer más noticias – a manada está solta, carros, gente, ônibus e buzina e buzina. Foi-se a intenção. É quinta.
Rená Tardin.

segunda-feira

A mulher e a estátua

Resolvi escrever para esse blog também. Faz um tempo – mas não muito – recebi um convite: Faça parte da nossa equipe! Achei esquisito, procurei saber se pagavam bem, se a equipe era legal, e se o espaço era regularmente utilizado por um bom debate. Tudo que encontrei foi um não paras as mesmas questões. Não há debate – todos não gostam do Jabor, por exemplo. Não se paga nada, e, ainda por cima, os “cronistas” são um grupo de pseudo-intelectuais-de-esquerda-cult-bacaninha-que-curte-falar-mal-da-veja. (Por isso que eu gosto da língua alemã. Não acho bonita, mas é funcional. Com certeza teriam uma só palavra para isso, apesar de desconfiar de que os alemães correrem maior risco de ter câncer de laringe.)

Enfim, resolvi colaborar. Tanto escrevendo como seqüestrando o Jabor.

Em Copacabana. Deveria ser aproximadamente o pico do horário do caos. Ou seja, de 10 às 19 horas. Para facilitar na visualização do leitor mais exigente, adianto que o astro-rei fervia a todo vapor. De dentro do ônibus, derretendo, não era possível conciliar com os 39 graus do termômetro de perto da Figueiredo de Magalhães. Ou seja, uma aprazível tarde de inverno no Rio. Tento me entreter com alguma coisa que não exigisse muito de minha mente escaldada, até que avisto uma estátua humana. Por quinze minutos pude servir como testemunha ocular que aquele homem não se mexia e tinha uma respiração quase que imperceptível. O figurino estava completo: prateado da cabeça aos pés, incluindo lábios, lóbulos das orelhas, umbigo e pálpebras; braço direito erguido, mão levantada com os dedos levemente separados; e, para completar, um pombo feiqui na cabeça. Percebi a aproximação de uma provável moradora de rua pela qual meus olhos já tinham passado quando estava sentada próximo à estátua pedindo dinheiro.

(Aqui, concordo que o fato de um mendigo se aproximar não seja nada relevante, ainda mais se levado em conta for o local em que a cena se desdobra. Em Copacabana, a população de rua só não é maior que a de velhinhos, mas com certeza é o bairro da cidade onde tem mais mendigos da terceira idade. Enfim, inútil comentário.)

Ao relevante. A senhorita aproximava-se mais da estátua queixando-se de alguma coisa. Até que pude ouvir:

- Não dá pra tu ficar aí não! – exclamou, gesticulando de forma a remeter a uma idéia de fim de papo no Maracanã. Deu um curto intervalo para esperar alguma reação da estátua, quando sem sucesso voltou a repetir:

- Não dá pra tu ficar aí não, tá me ouvino?! Ou tu também não escuta? Olha pra mim que eu tô falando contigo, porra!

Uma velhinha que vinha passando parou, olhou a situação, mas como a estátua não executava movimento e nem ensaiava reação, não julgou a situação como de potencial entretenimento.

- Olha aqui, esse ponto aqui é meu. Eu sempre peço dinheiro aqui. Se tu quiser, vai ficar do lado do velhinho lá da praia... mas aqui não tá dano pá tu, não! Tu fica aí paradão, todo pintado, recebendo dinheiro sem fazer nada! O quê que tu faz? Os verme tinha que tirar tu também... Porra, tá roubando a minha grana, tirano meu lugar, ninguém nem olha mais meus dois meninu... Esse povo já faz de tudo para desviar o olho da gente e você ainda fica aí, todo pintado, querendo aparecer... Se quiser pedir dinheiro, mermão, desce dessa porra, tira a merda dessa tinta, e faz que nem todo mundo, estende a mão, diz que tá com fome, que precisa comprar remédio, sei lá... dá teu jeito!

O ônibus andou.

quinta-feira

Classe média

"Quem é o mais miserável ser da terra? É o ser da classe média. Porque o pobre, o excluído, o proletário, para o cristão ou para o revolucionário, é o sal da terra. A classe média é um zero absoluto, ninguém está interessado nela. É a mais importante das categorias, não pode mudar as cosias, não tem interesse histórico."

Eduardo Coutinho.
Nem carece de crônica.

terça-feira

O mercado está com 'sistema nervoso'

Os mercados andam nervosos. E não é porque deixaram de tomar seus florais de Bach. Tampouco porque faltaram mais uma sessão de análise e tiveram que pagar por ela. A tal crise que tem deixado operadores das bolsas do mundo todo enlouquecidos foi causada por uma alta no índice de inadimplência das hipotecas norte-americanas.

Fiquei bastante intrigado como um cara que deve alguns milhares de dólares do pagamento de sua casa no Iowa pode influenciar no que vamos jantar amanhã, aqui no Rio. Essa economia global tem cada vez mais se assemelhado a Teoria do Caos.

Não vou discorrrer sobre essa teoria, não sou nenhum físico, nem tenho tamanha pretensão. Recorro a uma frase do senso comum para sintetizar o que eu considero ser a famosa teoria: "Uma borboleta bate asas no lugar X e causa uma tempestade em Y".

Utilizei letras porque não me lembrava muito bem quais eram os lugares originais. Uma busca no Google não ajudou muito. Cada resultado deu um país diferente, da Guatemala à China, com um leve bater de asas no Texas que, segundo a frase professada, causaria uma tempestade na Amazônia. Dado o clima equatorial da floresta, devem ser muitas as borboletas que flanam pelos céus texanos.

Enfim, levando em conta a tal Teoria do Caos do senso comum, podemos perceber suas semelhanças com a atual crise global. Ao que parece, ela já está controlada. Mas eu fiquei tão feliz de ter entendido um fenômeno da economia contemporânea pela primeira vez que resolvi compartilhar no blog.


Tudo pode ter começado com um americano rosa e gordo e sua família - igualmente rosa e gorda - que decidiu comprar uma casa. O americano rosa e gordo - vamos chamá-lo de John - não tinha economias suficientes e seu nome já constava do SPC Yankee há um bom tempo. Mas John não agüentava mais viver de aluguel, queria uma casa com jardim verdejante e cercas brancas.

John então pega um empréstimo de alto risco, oferecido por financeiras que aproveitavam os baixos juros praticados pelo Federal Reserve (o Banco Central de lá). Enfim, a casa própria. No entanto, uma série de cláusulas leoninas nas letras miúdas do contrato, como a possibilidade de juros e taxas serem pós-fixadas, endividaram John ainda mais. A alta dos juros americanos, de 1% para cerca de 6%, completou o cenário de dívidas e estourou a bolha imobiliária.

As tais financeiras que surfavam na onda das ótimas avaliações feitas pelas agências de risco (as mesmas que emitem o descalabro chamado 'Risco-Brasil') quebraram. Suas ações, confortavelmente instaladas em países emergentes pelo dinheiro farto e fácil, viraram pó num único dia. Estas mesmas ações sustentavam grande parte dos volumes negociados em bolsas do mundo todo. Resultado: todo mundo pro buraco!

No Brasil não foi diferente. A Bovespa chegou a cair 7%. Todo mundo desesperado e o governo se apressando em explicar que a economia brasileira conseguiria suportar a crise. No fim das contas, a coisa não fedeu em cima da patuléia, parafraseando Elio Gaspari.

Trilhões de dólares depois, parece que a crise foi aplainada. Mas John ainda está sem grana para pagar a hipoteca. Aguardem o próximo ataque histérico dos mercados.

Vamos seqüestrar um cronista

Resolvi - como diretor oficial desse blog anárquico - seqüestrar um cronista para integrar nosso plantel. (Falava plantel nos tempos que eu sabia algo de futebol, principalmente futebol de roça, futebol de várzea, sabia algo sobre o Vasco e adorava quando o flamengo perdia – não consigo explicar isso.) Seqüestraríamos um cronista para dar um Upgrade em nosso blog. Falo Upgrade a torto e a direito em tempos futurísticos, onde pessoas precisam estar sempre atualizadas, integradas, com o cartão de crédito no vermelho para comprar um novo computador. Nossa equipe - estranha equipe - precisa de um cronista de peso. Resolvi, em comum acordo com os outros integrantes, seqüestrar o João Paulo Vieira Machado de Cuenca, que escreve - ora, vocês sabem onde.
Estou refazendo os planos e analisando seus percursos favoritos. Por onde ele anda antes de escrever uma crônica. Ou se anda pouco e mente muito. Não importa. Temos boas pistas em suas crônicas. João do Rio ficaria orgulhoso ao saber que ele integra nosso plantel.
Numa artimanha de bom seqüestrador, procurei o endereço exato dele na telelistas e no google também, para evitar respostas equivocadas. Na verdade, eu não quero sair por aí para investigar a vida dele. Como bom cronista, está tudo lá. É tudo uma verdade embaralhada. Teríamos que vascular, cruzar informações, revisar crônicas antigas em outros veículos, googar (adorei essa palavra nova para essa vida de jornalista/cronista que levo ultimamente). Isso mesmo: vamos googar informações exatas sobre ele. Tudo articulado entre pessoas do blog e ninjas da internet. Seqüestradores de cronistas, uni-vos!

Mas por quê? Pelo Upgrade e pra melhorar o nosso plantel como já foi dito.
Mas, a bem da verdade, eu acho que podemos pedir um resgate da seguinte maneira: o Cuenca volta se ele integrar o time do segundo caderno. Não que eu ache que ele esteja em um lugar pior. Mas o segundo caderno do Globo está precisando de um U pgrade para melhorar o seu plantel. Não me atreverei a ofensas ácidas. Estou me formando e você sabe como é.
Tudo bem, só uma alfinetada: o Jabor em troca do Cuenca. Ele fica no segundo caderno às terças. O Jabor passará a integrar nosso plantel. Ele terá que escrever em uma maquina de escrever velha em nossa redação ensolarada, sem ar condicionado e repleto de livros marxistas, esquerdistas e bons filmes revolucionários. Enfim, ele terá que conviver com universitários seqüestradores de cronistas às vésperas da revolução. Seria um bom negócio. Vamos ao Cuenca. E de quebra a gente dá um sacode no Jabor.

Rená Tardin

Um P.S. sobre P.S.

Pois é. Eu tenho mania de P.S.. Quando isso começou? Não sei. Talvez seja genético.
Lembro que, quando era criança, via minhas tias escrevendo P.S. nos bilhetes e não entendia direito o que era. Aí, tive aula de latim (me sinto um dinossauro). Um dos trabalhos era sobre palavras em latim que ainda eram usadas. Ad eternum, in memoriam. Aí vem a minha mãe e diz: " P.S. Também é em latim". E ela estava certa (ela também é jurássica e também teve aula de latim).
Post Scriptum, ou P.S para os íntimos, é aquela coisa que você só lembra na hora que coloca o ponto final no texto: "Ih tinha que falar isso também, mas esqueci. Vou colocar no P.S.". Jurássicamente falando, quando não existia Word e "copiar e colar" demandava o uso de tesoura e cola, o P.S. era a salvação! Hoje temos mecanismos para disfarçar que algo foi escrito "após o escrito", mas imagine como isso devia ser um grande problema para quem usava latim!
Tem gente que acha o Bill Gates é um gênio, mas os romanos já tinha solucionado o problema de uma maneira bem mais simples. Além disso, acho que o P.S. tem um lado revolucionário: você pode mandar seu professor de redação do pré-vestibular catar coquinhos e escrever as coisas na ordem que você pensa! Afinal, se lembrar de algo importante, 2 letras, 2 pontos e voilá!
Descobri que sofria da síndrome do Post Scriptum quando escrevia no meu blog antigo. O P.S. se tornou um espaço para mandar recados para as outras meninas que também escreviam no blog, comentar algum texto postado antes, contar uma fofoca nada a ver ou descrever o tempo no Rio de Janeiro para matar as paulistas de inveja. Foi quando comecei a usar P.P.S., P.P.P.S. e assim sucessivamente.
Mais do que um artifício literário, acho q o P.S. é uma forma de pensar. Afinal, o que seria dos esquecidos, dos avessos a organizar as idéias antes de escrever e dos viciados em dar opinião sobre tudo sem ele?


(pra não perder o hábito) P.S.: Sobre o texto do Rená e o filme "Três irmãos de sangue": O filme é bom porque a história dos 3 irmãos é boa. Até se eu contasse, seria legal. Então, por que aquela divisão em blocos nada a ver? E pior: que fonte é aquela? Se é pra usar Times New Roman, use Verdana! Enfim, a história é tão boa que sobrevive à fonte tosca, à falta de depoimento de qualquer pessoa que seja do PT (a mulher do Henfil fala no filme que viu o PT surgir na mesa da sala dela e fica por isso), problemas nas imagens, o "BR" onipresente e a divisão em blocos.

segunda-feira

O cinema não coagula!

Sempre me pego as voltas de uma revista Caros amigos - de tempos idos - com o grande Henfil na capa. É de lá que vem a minha paixão por esse cartunista genial. Então fui assistir o documentário "Três irmãos de sangue" muito mais pra ver o Henfil. Fui pego de assalto pela força dos outros dois irmãos - histórias já conhecidas, mas a luta por liberdade em um país como esse nunca é de menos. Henfil diz no filme que preferia o cinema ao Cartum. Porque o cinema não coagula. Os segundos após a frase emocionam qualquer um. Mas e o documentário? Nem vou entrar no mérito de problemas óbvios. O filme vale. Então vá ver!
Eu venho falar do cinema. Do cinema no Brasil. Eu não agüento mais a petrolífera. Eu não agüento mais saber que quem decide o que vai ser feito no cinema são alguns figurões e suas canetas Montblanc. Basta! Como os paisanos da Zona Sul. Basta! Mas é um pouco isso mesmo. A coisa aqui tá ficando preta. "Então fale logo o motivo!" No Brasil, não existe cinema independente. Existe até um cinema de autor, pago pela petrolífera e algumas poucas outras empresas. E tudo com verba do cidadão.
Alguns vão gritar: isso é uma heresia! Não fale assim. Mas, sabe, eu não quero um cinema entregue ao mercado. Eu quero um cinema que tenha outras possibilidades de produção e distribuição. E quando vejo um Doc chapa branca desses em que o logo da petrolífera entra irritante no começo e entra, de forma mais irritante ainda, na orquestra Petrobrás, que aparece como uma passagem de bloco de um telejornal qualquer. Em todas as "mesinhas" onde o músico coloca sua partitura tem o maldito "BR". Cara de pau demais. BR, BR, BR, BR em tudo.
Isso parece que justifica a ausência de questões políticas importantes na vida desses irmãos do Brasil. Onde está o Lula? O PT? Não dá pra tirar esses assuntos. Lembro de um outro documentário sobre o Henfil em que o Lula fala: "Muito respeito com o que vocês vão falar do Henfil". E aí você paga o filme e tem que ver BR, BR, BR. É um saco e não há muita saída por enquanto, pois parece que está todo mundo adorando. Não dá pra ouvir as pessoas falando: ótima fase do cinema, cinema de retomada. Estamos presos aos petrodólares. Isso não é cinema. Cinema não coagula.

Rená Tardin

sexta-feira

O dia em que eu entrei na fila

Surreal. Acordei às seis da manhã. Não acordava tão cedo desde que passei pra faculdade. Peguei um ônibus lotado. Em pé. Cheguei na fila. 174 pessoas já estavam lá na minha frente. Pra quê? Pra tirar o passaporte. Foi exatamente a pergunta que me fiz: "Tanta gente assim vai viajar pro exterior?". A resposta: "Aparentemente sim".
Aí, começou a malandragem. Gente alugando banquinhos de plástico, outros guardando lugar na fila, um cara que já tinha tirado o passaporte na semana passada contando suas experiências. De dois em dois minutos, eu pensava: "O que eu tô fazendo aqui?".
Peguei a senha. Um papelzinho, tipo sobra de papel jornal, com 175 escrito na frente e uma rúbrica atrás, que me dava o direito de ir pro trabalho e voltar lá mais tarde.
Fui. Voltei. Estava no 215. Uma hora depois, chegou no 230. Em três horas esperando, comecei a entender as coisas. O número de senhas distribuídas varia de acordo com o humor (ou a previsão astrológica, sei lá) do dia. Ontem, distribuíram 274. Em cada parede do prédio, tinha um papel ofício com uma informação diferente. Pra que escrever tudo numa folha só se você pode usar vinte folhas? Todo o comércio local sobrevive de xerox, fotografias e acesso à internet para quem vai tirar passaporte. Vão todos ter que se mudar pra perto do Galeão (se é que isso é possível) agora que vão transferir esse departamento pra lá. As pessoas não sabem ler e pedem informação pra qualquer um que encontram pela frente, menos para os que estão sentados bem embaixo da placa com a palavra "Informações". Ar condicionado não existe. Água, só se você comprar do lado de fora. Nenhum banheiro à vista. Se você quer viajar, você tem que querer muito, senão vai desistir no meio do caminho.
No final, nem era tão difícil assim: entreguei os documentos pro carinha lá e tenho que ir buscar meu passaporte no Galeão daqui há vinte dias.
Mas pra que facilitar, né?

P.S.: Na volta, a Radial Oeste tava engarrafada. Por causa do Fla-Flu.
P.P.S.: O texto do Rená está bom porque eu o revisei. Mas, Bernardo, pare de humilhar. Fiquei até com medo de escrever depois do seu post.
P.P.P.S.: Inveja enorme de quem consegue resolver as pendências do trabalho pelo celular no café da Travessa. Por aqui, ainda não chegamos na pós-modernidade.

terça-feira

Via ápia

"O trânsito segue lento na Avenida Radial Oeste para quem segue sentido Centro. O panorama é o mesmo no sentido Maracanã. PMs fazem uma blitz na altura da estação de metrô de São Cristóvão, causando retenções ao longo da via"

Pode parecer um clichê - e é - mas a Radial Oeste é a síntese do Rio. Não aquela cidade idílica das novelas em horário nobre, mas a urbe real. A cidade do café com pão, do trem lotado, dos jornais em tamanho tablóide.

Ela começa numa extensão da avenida que leva o nome do pai dos pobres, Presidente Getúlio Vargas, ainda sob o aroma pouco agradável do Canal do Mangue. Um viaduto deságua na Praça da Bandeira. Ali, convivendo (quase) harmoniosamente, está a imponente bandeira da nossa república, a linha do trem e a zona de baixo meretrício mais famosa do Rio: a Vila Mimosa. Na hora do rush, vendedores pipocam por todos os lados, oferecendo toda a sorte de mercadorias - de tangerinas a flanelas - aos estressados motoristas.

Seguindo em frente, margeando a linha 2 do metrô, abrindo caminho sentido Zona Norte, o coração pulsante e marginalizado da ex-capital federal. O Maracanã se impõe sobre a margem esquerda, enquanto o Morro da Mangueira começa a despontar à direita, no horizonte.

Por ali, os sons são vários. Desde as reações audíveis das torcidas no estádio cheio em dia de jogo, até as estocadas secas produzidas pelos fuzis nas operações policiais na favela. O fantasma do Museu do Índio, hoje ocupado ilegalmente por famílias descendentes daqueles que, legalmente, ocupavam todo o território do Brasil, completa a paisagem.

A atmosfera concretista da Uerj também faz parte da Radial Oeste. Ninguém acredita quando fica sabendo que o arquiteto da universidade hoje é presidente de Furnas. A pergunta que ronda a mente é: como arquiteto seria ele um bom presidente de Furnas, ou vice-versa?

Independentemente da resposta, o que temos hoje é a universidade sucateada, vivendo da fama de intocável que as universidades públicas gozam até hoje. Resta saber até quando. Será que outro reboco cairá? Preparem as faixas "em estado de greve".

Na praça de vergonhoso nome Emilio Garrastazu Médici, vive uma família de moradores de rua. Anônimos e ambulantes para quem passa por ali. Motivo de protestos por toda a burguesia local.

"Eles são sujos, emporcalham a praça, assaltam os transeuntes, não se vestem bem, nem se envergonham de usar drogas ou fazer sexo na via pública", indigna-se uma senhora tipicamente tijucana, com seu poodle calçado e sua blusa comprada em Guarapari.

Com o início dos Jogos Pan-Americanos, todos sumiram. Para onde foram? Não se sabe ao certo. Mas não fez mal, pelo contrário, ajudou os índices de popularidade do governador e do prefeito. Mendigos não votam, tijucanos sim.

A Radial Oeste acaba ali, como numa confluência de rios. À noite, o fluxo de veículos nos faz lembrar um grande ribeirão a luz do luar. Uma forma de "fugere urben" em meio ao caos.

Na definição de Aurélio, Radial é aquilo que emite raios. Mas também pode ser definido prosaicamente como "rua que vai do centro à periferia urbana". Será que até Aurélio já passou por ali?

Docs In Rio ou o Super 8 vai salvar o mundo

Então, vamos a uma lista de documentários. Nada de crônicas, como é de praxe - mesmo que sem regularidade e visibilidade - adotando a onda de não às crônicas virtuais. Não gosto de escrever sobre cinema. Cinema é audiovisual. Vá lá e veja, acho que isso resolve. Muitos do que escrevem resenhas e críticas no jornalismo da grande imprensa fazem - só - com que os filmes não sejam vistos. Quando se fala de documentário é pior ainda - uma canetada de um maldito bonequinho põe tudo a perder. Tudo bem que se o Doc do Tendler não vingar vai passar no Futura mesmo.

E quem assiste documentários no Brasil? E quem paga os documentários do Brasil?

Vamos aos Docs:

Bobby
É suspeito escrever sobre esse filme. Não quero um presidente americano salvando o mundo. Mas as caras não têm mais saídas. O que dá pra esperar de um Bush? Tá fudendo todo mundo. Então, o cara constrói o mito de um quem-sabe-presidente - que morre, é lógico, é a saga dos Kennedys - a partir de imagens da época. Boby não aparece em momento algum do filme. Então, a trama vale cada caríssimo centavo. Pelas imagens documentais, pela trama bem construída e pelo LSD! Vida longa ao Super 8!

Person

O super 8 salva a vontade de fazer cinema. Marina – vida inteligente na MTV! - constrói o personagem do pai a partir de uma grande pesquisa, olhando pra si e pras lacunas que deixou seu pai – morto em um acidente de carro. Levanta um arquivo de imagens belíssimas e depoimentos que dão a real força que o cinema de Person teve. Lembro de assistir o filme com a presença da diretora em um festival de cinema universtitário. Não dá pra negar o carisma da Marina. E não dá pra negar que é um projeto de cinema - e um cinema do Brasil.

Fabricando Tom Zé

Nem precisa falar. É o Tom Zé. O grande trabalho fica pro diretor em conseguir montar um material infinito de forma atraente. E o super 8 salva tudo!

O último Bandoneón

Aqui tem um bom doc. Pela música argentina. Pelas imagens. Por construir a história de uma cultura musical a partir de um instrumento perdido no tempo. O doc-drama tem um tipo de problema-solução: salvar a história, juntar os elementos e, fazendo isso, é mais fácil o erro e a pieguice. Dane-se o erro. O diretor conseguiu achar a medida de atuação e documento. Vale. Mas não tem super 8!

O fim do sem fim

Fica pro fim. Pro fim de semana.

testando

batatinha qndo nasce...