sexta-feira

Na elite cinematográfica

Tropa de jurados do Minc renega sucesso de José Padilha e seleciona “O ano que meus pais saíram de férias” como representante brasileiro no Oscar 2008

Numa banca de camelô em frente ao Palácio Gustavo Capanema, sede do Ministério da Cultura no Rio, o filme de José Padilha “Tropa de Elite” é o mais procurado. Na mesinha improvisada pelo ambulante não há espaço para “O ano em que meus pais saíram de férias”, filme de Cao Hamburguer, lançado em 2006. Apesar de toda a polêmica envolvendo a trama dos policiais do Bope, o filme escolhido pelo júri para representar o Brasil na cerimônia do Oscar de 2008 é uma sensível história passada numa época dura para muitos brasileiros: o regime militar.

Enfileirados em cadeiras pretas a frente do gigantesco painel de Cândido Portinari que ornamenta a sala do segundo andar do prédio do MinC, os seis juízes pareciam enfastiados. Os cineastas Hector Babenco e Bruno Barreto; os críticos de cinema Rubens Ewald Filho e Leon Cakoff; e os jornalistas Ana Paula Sousa e Pedro Butcher justificaram sua decisão unânime por acreditar que “O ano...” tenha o perfil que agrada os olhos dos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood.

A escolha foi feita a partir da análise de 18 filmes, entre eles “Batismo de Sangue”, de Helvécio Ratton, e “Saneamento Básico”, de Jorge Furtado, além do já citado “Tropa de Elite”. A escolha final, segundo o júri, ficou entre “Céu de Suely”, de Karim Aïnouz, e os filmes de Hamburguer e Padilha. Referendado o resultado, após uma manhã de discussões, o filme segue para o aval dos americanos, juntamente a outras 90 produções de todo o mundo. Os cinco filmes estrangeiros que disputarão a estatueta dourada só ficarão conhecidos em 22 de janeiro, no anúncio dos indicados ao Oscar.

– Precisamos deixar bem claro que não estamos escolhendo o filme do ano. Escolhemos a produção que irá representar o Brasil numa seleção internacional com prêmio americano. A meu ver, esse filme é o que mais se aproxima do padrão do Oscar. Gosto de “Tropa de Elite”, mas é uma produção que segue os padrões americanos – explicou Ewald Filho.

O diretor de “O ano que meus pais saíram de férias” foi o terceiro a saber que seu filme havia sido escolhido. Os primeiros foram os próprios membros do júri e, em segundo lugar, a imprensa, convocada às pressas para uma coletiva. Lembrado por um repórter durante a entrevista, o secretário de Audiovisual do MinC, Orlando Senna, pediu a uma assessora o telefone do cineasta.

– Parabéns! – exclamou Senna ao telefone, mesmo antes de dizer “alô”.

Premiado no Festival de Berlim, “O ano...” estreou em novembro de 2006. Desde então, foi exibido em mais de 20 países. O filme se passa durante a Copa do Mundo de 1970 e conta a história de um menino que é deixado pelos pais, perseguidos políticos, na casa do avô. O que era para ser apenas um mês de férias sem mãe nem pai, dura cerca de um ano. A produção é baseada na história do próprio diretor, filho de um casal de judeus militantes de esquerda e que foram perseguidos durante os anos de chumbo. Ao saber da indicação, Cao Hamburguer, não escondeu o entusiasmo.

– É um filme que vem realizando uma carreira muito sólida, não só no Brasil como também no exterior. Acho que esse binômio que opõe o tempo sombrio da ditadura com o brilho da seleção de 70 é uma metáfora de como a vida segue, com dias nublados e, de repente, um raio de sol. Essa dicotomia foi boa para armar a estrutura da história. Sinto que, para o brasileiro, essa foi uma época muito forte por conta de todos estes acontecimentos.

Ao saber que o filme mais vendido em sua banca na Rua Graça Aranha não será o provável representante do Brasil no Oscar, o camelô não se furtou:

– Se esse que ganhou for bom mesmo vai vender que nem este.

Nenhum comentário: